Recuse venda casada se o banco ‘empurrar’ outro produto ao dar empréstimo
João Antônio Motta
17/09/2018 03h00
Não é raro você ir ao banco pedir um empréstimo e o gerente lhe pedir a compra de um seguro, de um plano de capitalização ou de previdência privada, a chamada tal da reciprocidade. Se o banco está lhe atendendo seria justo que você também atendesse a um pedido do banco, certo? Errado, e muito errado.
Em primeiro porque o banco não está lhe concedendo crédito gratuitamente, ao contrário, ele está cobrando e cobrando bem pelo dinheiro que lhe está alcançando. Por qual razão então lhe entregar nova vertente de lucro? Não há motivo para isso e apesar do gerente ser pressionado para cumprir metas de vendas, você deve adquirir apenas produtos e serviços que sejam do seu interesse.
Observem o caso do banco lhe emprestar R$ 10 mil e pedir que "deixe" aplicado em algum investimento, CDBs, parte deste valor, R$ 2 mil por exemplo. Continuando, imagine que você está pagando pelo empréstimo 4% ao mês e, no investimento, recebendo 0,8% ao mês. No final do mês, você deverá pagar R$ 10.400,00 ao banco e receberá R$ 2.016,00. No final das contas, você recebeu um empréstimo de R$ 8 mil, que foi o que realmente utilizou, pagando por este montante R$ 384 de juros, o que representa 4,8% ao mês.
Esta é a conta que representa o tamanho do problema da venda casada, a alteração artificial da taxa de juros. No exemplo, você contratou 4% ao mês e acabou pagando 4,8%. O Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90) em seu artigo 39 veda e diz que é prática abusiva a venda casada e, assim não fosse, desde há muito o Banco Central já determinava obrigatoriamente aos bancos. Primeiro através de uma disposição no Manual de Normas e Instruções, que dizia ser "vedado aos bancos comerciais realizar operações triangulares, assim caracterizadas aquelas que impliquem na aceitação de depósitos, a vista ou a prazo, mediante compromisso de efetuar empréstimos a pessoas físicas ou jurídicas, ligadas ou não a instituição financeira" (MNI/BACEN 2.3.1.4.).
Após, em 2001, veio a edição pelo Banco Central da Resolução 2.878, que reforçava ser "vedada a contratação de quaisquer operações condicionadas ou vinculadas a realização de outras operações ou a aquisição de outros bens e serviços" (art. 17), explicando ainda que esta vedação também se aplicava às "promoções e ao oferecimento de produtos e serviços ou a quaisquer outras situações que impliquem elevação artificiosa do preço ou das taxas de juros incidentes sobre a operação de interesse do cliente" (art. 17, § 1.º).
Como está evidente, não só o Código de Defesa do Consumidor veda a prática de empurrar a compra de outro produto ou serviço para a liberação de empréstimos, como o próprio Banco Central veda este tipo de operação, na medida em que provoca a elevação artificial da taxa de juro cobrada no empréstimo.
Portanto, não aceite que lhe empurrem a compra de um seguro, de um plano de capitalização, de previdência privada, ou mesmo a aplicação de parte de seu dinheiro em um "investimento". O prejudicado certamente será você e, para resolver isso, somente após uma longa disputa judicial.
Sobre o Autor
João Antônio Motta é advogado (PUC/RS – OAB em 1982) especialista em obrigações e contratos, com ênfase em direito bancário, econômico e do consumidor. É autor do livro “Os Bancos no Banco dos Réus“ - Ed. América Jurídica, (Rio de Janeiro, 2001).
E-mail de contato: contato@jacmlaw.com
Sobre o Blog
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