Por falta de concorrência real, cliente de banco não escapa de juros altos
João Antônio Motta
12/03/2018 04h00
Em abril de 2005, a propósito da declaração do então excelentíssimo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, que afirmou que "Ele [o brasileiro] não levanta o traseiro do banco, ou da cadeira, para buscar um banco mais barato. Reclama toda noite dos juros pagos e no dia seguinte não faz nada para mudar", escrevi sobre a inutilidade da fala de Sua Excelência, dada a falta de concorrência no setor bancário. Disse, textualmente, crer com profunda convicção que os ares de Brasília têm algo de "alucinógeno", porque somente alguém debilitado de suas capacidades mentais pode dizer haver concorrência no segmento bancário e que é fácil (ou útil) abrir uma segunda conta-corrente bancária.
Falei e acredito que nada mudou sobre o fato de que quem reclama dos juros é porque, em grande maioria, está com a conta no vermelho e obviamente para abrir outra conta em um novo banco é necessário um depósito inicial, coisa que o "brasileiro" não tem.
Não bastasse isso, somado ao fato de que certamente obtendo crédito em outro banco o "brasileiro" passará a dever para dois credores, e não apenas um, haveria de se analisar a "competição" existente no sistema bancário.
Na época, acessando a página do Banco Central (BACEN) na Internet, podiam-se ver sete bancos – Banco do Brasil, Bradesco, Itaú, Caixa Econômica Federal, HSBC, Unibanco e ABN REAL – que concentravam 80% do volume dos depósitos, tendo 13.515 agências de um total de 17.402 instaladas no país. Se podia constatar, também, que referente às taxas do cheque especial, as mesmas variavam de 7,36% ao mês a 8,16%, havendo uma diferença percentual de apenas 0,8%.
Assim, quem estivesse devendo R$ 1.000,00 no cheque especial, ao trocar de banco, poderia obter uma "economia" de, no máximo R$ 8,00 o que era absolutamente sem sentido frente às tarifas e até mesmo a condução necessária até outra agência.
Mas e como está a "concorrência" bancária em 2018?
Buscando a mesma fonte, o Banco Central (BACEN), pode-se ver que os maiores bancos por rede de agências são: Banco do Brasil (1º – 4.956 agências), Bradesco (2º – 4.927 agências ), Caixa Econômica Federal (3º – 3.497 agências), Itaú (4º – 3.405 agências – ) e Santander (5º – 2.673 agências). Ou seja: 19.458 postos de atendimento de um universo total de 21.640 agências no País.
Portanto, de sete bancos em 2005, hoje a concentração está em cinco bancos, sendo que estes atendem não mais 80%, mas 90% do volume bancário no Brasil.
E como estão as taxas de juros, que sistematicamente, deveriam cair após seguidas reformas legislativas das operações bancárias e uma moderna Lei de Falências e Recuperação Judicial? Quais são as taxas de juros praticadas atualmente entre estes cinco bancos?
Em pesquisa, no mesmo Banco Central, é possível ver no período de 14 a 20 de fevereiro de 2018, as seguintes taxas de juros ao cheque especial: Banco do Brasil (12,52% ao mês), Bradesco (12,30% ao mês),Caixa Econômica Federal (12,47% ao mês), Itaú (12,76% ao mês), e Santander (14,76% ao mês).
Ou seja, quem deve R$ 1.000,00 no cheque especial está sendo "espetado" em juros ao mês, considerando a maior taxa praticada (Santander 14,76% ao mês) de R$ 147,76. Já quem é cliente do Banco Bradesco, que tem a melhor taxa (12,30% ao mês), deixa ao banco R$ 123,00 no final do mês.
A diferença entre a maior e a menor taxa é de R$ 24,76 ao mês, o que é um montante "absolutamente sem expressão" para alguém pegar uma condução, ir ao banco (onde geralmente não é bem tratado) realizar um depósito inicial quanto a "Confecção de cadastro para início de relacionamento" (R$ 30,50 no Banco do Brasil) e, depois disso, um mínimo de R$ 12,15 ao mês.
Como se vê, o brasileiro continua a não levantar o "traseiro da cadeira" porque sabe da inutilidade do ato, pois longe de ter algum ganho, irá perder tempo e dinheiro (que não tem) em abrir uma nova conta-corrente que, como acima demonstrado por dados insuspeitos do próprio Banco Central, não trará vantagem alguma, visto que não há concorrência de mercado entre nenhum banco.
Assim, como em 2005 quando Sua Excelência passou longe da realidade, continua e piorou o cenário, pois lá se disse que sem concorrência os bancos nadavam de braçada em um "spread" fantástico de 500% ao mês, quando hoje, mais concentrados, é ainda mais injustificável que os bancos paguem 0,59% ao mês para captar R$ 1.000,00 em CDB e, em outra ponta, cobrem até 14,76% ao mês para emprestar em cheque especial – um "spread" bruto de 2.400% ao mês.
Continua e piorou a injustificável margem de lucro nas operações de crédito que, somadas às tarifas estratosféricas, continua a nos fazer suspirar por um "MSB – Movimento dos Sem Banco".
Sobre o Autor
João Antônio Motta é advogado (PUC/RS – OAB em 1982) especialista em obrigações e contratos, com ênfase em direito bancário, econômico e do consumidor. É autor do livro “Os Bancos no Banco dos Réus“ - Ed. América Jurídica, (Rio de Janeiro, 2001).
E-mail de contato: contato@jacmlaw.com
Sobre o Blog
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